Unidos de Bangu, Em Cima da Hora e Alegria da Zona Sul passaram na Sapucaí.
O site SambaSul conta mais uma vez com o talento do jornalista Luiz Felippe Reis nas análises dos ensaios técnicos na Marquês de Sapucaí visando o Carnaval 2015. Assim como no último carnaval, também estará presente nos desfiles oficiais, trazendo sua visão.
Confira
"Começou o ano! A cortina se abriu para o destrinchar do Carnaval, acompanhado do verão, da praia e já já do Maracanã, e eventualmente uma casa aprazível na rua Ceará. Rio de Janeiro contemplado em verso, prosa, poema e amor . O templo sagrado do Carnaval foi devidamente debutado na Temporada 2014/2015 por Unidos de Bangu, Em Cima da Hora e Alegria da Zona Sul nessa estreia feliz do palco principal do samba. Fidalguia não faltou. Gente apaixonada também não. Talvez um ou outro contingentezinho a mais, uma técnica maior, uma organizaçãozinha ali, outra acolá. Importante, mas algo a ser relevado. Afinal, estamos em dezembro. Mês do peru de natal, mês do planejamento de festas familiares. Quem acompanha de perto as escolas da Série A sabe que tudo por lá é mais difícil. O entrosamento da galera desfilante é mais demorado, a verba chega em cima da pinta. A atração não é das maiores, inicialmente. Colocar um ensaio técnico de Sapucaí em dezembro para essas escolas, ainda em processo de erguimento e de projeto Carnaval incipiente, é uma crueldade. É como fazer prova de concurso sem dormir. Você vai lá, cumpre seu papel, já pagou a taxa, tem que ir, dá o seu melhor. Mas acaba não sendo suficiente aos olhos críticos. Sorte que não é concurso. Ninguém prestou prova. Era só um simulado. Melhor assim. Os concorrentes pensam que você não está no páreo.
Unidos de Bangu pisou na Sapucaí por volta de 19h30 já se despedindo do sol. Logo o sol. O que seria de Bangu sem o sol? Bravo companheiro dos 43° graus, inclemente invariável. Um parceiro de longa data e que construiu um pouco essa linda mística banguense, a identidade do bairro reside também ali. Um abandono difícil de entender. Um sol que observou placidamente o girar da terra durante 12 horas não foi capaz de estender-se por mais uma horinha para acompanhar o melhor amigo. Pior para o sol. Bom para o conforto das estrelas e nuvens, que dividiram espaço para acompanhar a catarse de Bangu. Ah, que festa! Vi muita alegria de uma escola que volta depois de tantos e tantos anos fora do epicentro sísmico carnavalesco. Uma expressão cultural de um povo que defende seu chão, sua bandeira e sua gente. Muito melhor que ganhar, inclusive. Ganhar é só uma. Ganha um. Todas podem vencer. A Bangu sai vitoriosa dessa noite de sábado. Um bom ensaio, ainda há o que fechar, há um trabalho longo de mais de um mês para entrar competitiva na sexta-feira de Carnaval. A Bangu tem cantores talentosos (Marcelo Rodrigues e Alex Soares) que entoaram bem o samba-enredo, bastante correto por sua vez. Uma cadência bacana de Mestre Zumbi. Os quesitos parecem bem entregues de casal à bateria, comissão de frente à harmonia. Não vamos exigir correção de uma Beija-Flor, Tijuca ou Salgueiro. As circunstâncias jogam contra. Dá para exigir o mínimo: cantar o samba, mostrar empolgação e vontade de fazer história. Isso a Bangu mostrou!
Em Cima da Hora mostrou que é uma escola de samba de comunidade mesmo. Cavalcanti sempre fez falta à cena carnavalesca e agora volta ao brilho, se destacando entre as demais. Um 2014 de um trabalho sério, eclodindo competência da direção, fez a escola driblar os problemas e chegar forte na plástica. No chão, a comunidade manteve o nível, e todos, juntos, debelaram os dogmas do ioiô e estão aí, mostrando firmeza de escola das boas e ali está para ficar. A diretoria trouxe camisetas como se estivessem grafitadas, com o nome da escola. Evidência de quem não está acomodado. Neste certame duro de 2015, foi o tempo certo de não mostrar-se satisfeita com o simples, com o primário. Em cima da hora de estar fora da zona de conforto. Um algo a mais. Como na Bangu, uma ou outra desordenação entre as alas. Natural para quem ainda há de intensificar os ensaios de bairro. Com um samba satisfatório e um Ciganerey canhão, energético e confiável, a azul e branco deve ficar bem musicalmente. A comissão de Frente do ótimo Jardel Augusto Lemos segurou demais a escola, passou muita informação. Acho que vai rolar um processo de enxugamento ali. Acabou prejudicando levemente o andamento, arrastado por fim. A escola de Cavalcanti cumpre seu papel. Obrigação honrada. Mostrou mais uma vez um chão de potencial a ser melhor trabalhado. Promete, no mínimo, uma comunidade atuante na hora do vamos ver. Boa candidata a desfile agradável na sexta-feira
Alegria da Zona Sul veio toda uniformizada, num padrão modo alegria mesmo. O samba coaduna perfeitamente com o espírito moleque da escola e da Zona Sul. É aquela pegada mais leve, solta, menos poética, mais alegre. Despretensão, sentimento próprio dos vencedores. O samba é bem assim. Letrinha boba, sem poesia, mais tiradora de sarro, mais zoadora, mais pegadora e ferrabrás. Samba fácil, sem códigos, sem fenomenologia, nada cientificista. É samba! Missão simples de Pulular prazer. Daquele que você completa a letra por intuição e acerta. Quer coisa melhor? Aliás, inspirado no amigo Marcelo Barros, diria que "Canta Zona Sul" ao final de todo refrão final deveria ser estatutário, registrado em cartório se for possível. E quem não quer assim, beleza, tudo bem. Não quer alegria no Carnaval? Tranquilo. Muda o nome da escola então, sugere lá: Poética da Zona Sul; Carlos Drummond de Andrade da Zona Sul; Jorge Luís Borges da Zona Sul; Literária da Zona Sul; Erudita da Zona Sul; sugira. Enquanto for Alegria, alegria trará. Uma Renata Monier experiência coreográfica plena e bem exercida neste sábado. Comissão de Frente escondeu o jogo, mas não deixou de mostrar algum preparamento. Muita gente cantando o samba, mais que as outras duas. As mesmas falhas pontuais das outras em Evolução, um certo desnível na Harmonia, natural. Um Alexandre D´Mendes, super gente boa, e que nos faz voltar no tempo, com a Rocinha e aquele samba do Mickey de 97. Regressão poética esta. Propalada como candidata forte ao rebaixamento, Alegria deu seu grito do Ipiranga e mostrou alguma estridência no berro, decibelímetro pulsante."