Império da Tijuca, São Clemente, Grande Rio e Salgueiro sob o olhar de Luiz Felippe Reis.
DOMINGO
ACADÊMICOS DO GRANDE RIO – “Tomara que eu esteja errado”. Mentira! Frase mais mentirosa da história da humanidade, certamente. A melhor sensação do mundo é notar o acerto vindouro, descobrir que você foi no alvo, certeiro. Tai, na Grande Rio acertei. Fiquei feliz por mim, num egoísmo claríssimo, e pela tricolor, pré-conceituada pra lá e pra cá. Atingida por uma má vontade explícita de muita gente. O samba que eu torci na final foi escolhido batendo Jorge Aragão, Péricles e Arlindo Neto. O samba que eu defendo desde o início aconteceu no CD e foi ganhando adeptos aos pouquinhos. O samba que protegi absorveu ou foi absorvido pelos componentes. Vi a comunidade cantando com amor. Espírito elevado. Encontro celestial dos anjos, lá de cima. Deus de corpo presente na pista. Um ensaio técnico abençoado. A mim, inspirador. Émerson Dias encontrou um samba ideal para ele. Casamento perfeito, sem comunhão de bens, sem DR, sem contas a pagar, sem separação nem traição. Amor total até que a morte os separe. Para o intérprete a chance parece ter vindo no momento certo. Experiente e ao mesmo tempo cheio de ímpeto para mostra-se a todos como um dos melhores. E eu, na humilde, concordo. Émerson é top. E o samba, meritório clássico aos 10, com uma Maricá poética, do sol que bronzeia a morena, sem "caozada" de português, de colonizador, do ordinário, do comum. A poesia da areia, do sol, do mar, do bronze, do barquinho que vai ao ordenar do vento. Gosto muito. E funcionou. Harmonia perfeita. Canto vibrante sem declínio, com uma evolução esfuziante durante todo o transcorrer do desfile, no meu ponto, claro. A Grande Rio brincou, alegrou, confesso arrepios em dados momentos. Dentre todas, a que mais curtiu estar ali, numa alegria típica de carnaval. Os erros da evolução foram observáveis no referente à ordenação dentro dos grupamentos, notadamente nas alas 15 e 26. No mais, Emocionei-me com o ensaio, e o público veio junto também. Logo na Comissão de Frente, comandada por Jorge Teixeira, uma apresentação sem muitos indícios da coreografia oficial, com a exuberância de Suzana Vieira. Quando ela era erguida pelos bailarinos da Comissão, a Sapucaí vinha abaixo. Alguns podem achar inadequado. Eu acho demais, o famoso bizu. A Grande Rio entendeu que o ensaio técnico é um treino sério, mas também um evento que carrega consigo a necessidade da espetacularização também. Uma questão de consideração ao público que vai lá e possivelmente não estará no dia oficial. Talvez não tenha sido o ideal para o evoluir do casal, Verônica e Luís Felipe, que vinha na sequência, mas é algo que não acontecerá no dia 2 de março. Outro destaque foi Bárbara Evans. Desconcentrada, invadiu a ala das baianas. Hilário. Mas não vi descompromisso da menina. Vi loucura de bom grado. Maluquice beleza, relembrando a mamãe. Fossemos loucos assim, o mundo era melhor, com menos guerras e mais sorrisos. A Grande Rio está pronta. Tem toda pinta de desfilaço no domingo de carnaval. E a minha simpatia pela tricolor é gigante. A escola tem rico, tem pobre, tem gostosa, tem baranga, tem gay, tem macho, tem atriz, tem ex-bbb, famoso, anônimo. Tudo em profusão. Aglutina geral, numa comunhão do bem. Quadra sem limpeza étnica. A Grande Rio se presta ao carnaval, numa miscelânea de raças e realidades.
ACADÊMICOS DO SALGUEIRO – O Salgueiro é favorito em qualquer carnaval que participe. A era Regina Celi é vitoriosa, talvez a gestão que mais inspire segurança entre todas as grandes do carnaval. Garantia de apresentação bem feita. Não a toa é a escola campeã de enredos patrocinados nos últimos anos - e patrocínios sérios de empresas boladas. É Fox, é Caras, Nissan agora. Em domingo de Valeska Popozuda no Faustão, o Salgueiro também distribui beijo no ombro nas outras. E o dinheiro chega de verdade, sem essa de patrocínio gratuito que rola por aí. Desfiles grandiosos e impecáveis do Salgueiro foram admirados por nós. E, claro, isso passa por um Renato Lage, o melhor de todos na arte de criar desfile. Nunca vi alegoria feia do Mestre Lage, te falar. E o ensaio foi mais um simulacro do sucesso certo da vermelho e branco em 2014. Escola que sabe desfilar, dos melhores chãos da Sapucaí, mesmo nível de Tijuca e Vila Isabel, e só abaixo da Beija-Flor. E no ensaio mais uma vez vimos isso. O Salgueiro botou o braço na mesa e chancelou, com marca d´água, que é favorita este ano de novo. Sou voz dissonante sobre o samba. Eu já gostei dele, hoje não gosto. Acho arrastado. Na avenida foi bem cantado, carro de som sem problemas, com um Quinho sempre convidativo ao desfile. A falha - se é que existe – é da obra em si. É a natureza dela, a construção melódica mesmo. Não tem pra onde correr. Mas essa visão minha é dissonante total, e entendo isso. A cabeça da escola veio produzindo a onomatopéia do “Tchi-tchi-tchi”. Som clássico do evoluir em lentidão, pouco solto. Fúnebre até. Vi falhas em ordenação neste grupamento inicial também. Ainda à frente, para terminar o que vi de errado, a Comissão de Frente veio bem, tudo certo, sem problemas. Só não entendi aquele casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira que veio à frente do casal oficial. Posso estar sendo ignorante, mas não os conheço, e achei sem pé nem cabeça aquilo ali. O casal oficial, Sidclei e Marcella Alves, foram sensacionais só para manter o esperado. Marcela é diva total. Simpática sem precisar sorrir o tempo inteiro. Adoro essa pegada dela. É um charme natural. Altivez sem arrogância. Superior sem ser esnobe. Simpatia na medida certa. Com o aproximar do carro de som, aí o Salgueiro deu o sacode que a gente veio para ver. Evolução e harmonia perfeitas, sem erros. Só a destacar os carros de última geração da Nissan que representavam as alegorias. Suntuosidade. Gostei disso, embora eles tenham causado uns espaçamentos entre alas além do normal. Mas não é problema para o dia 2 de fevereiro. No geral, a maioria das alas cantou demais, e fez o Salgueiro exibir um corpo capaz de levar à escola ao décimo título. É questão de tempo. Sem posição de desfile prejudicial, o Salgueiro é favoritão. Salgueirão bolado!
SÁBADO
IMPÉRIO DA TIJUCA – O terremoto proposto no samba do Império da Tijuca foi no mínimo adiado, quem sabe até cancelado por este ano. Na Escala Richter, não foi captada grande energia sísmica. Alívio para chilenos, japoneses. Lamento para os cariocas e amantes do carnaval que torciam por um Império que botasse o braço na mesa com altivez. Uma sentada na janela sem licença. Expectativa positiva transformada em realidade a ser analisada aqui e por aí. A verde e branco não evoluiu. A mim, pareceu uma escola com receio. Encarou a obrigação de fazer bonito. Quem faz por obrigação, como num quartel, faz sem amor. A liberdade e a felicidade possuem de modo inexorável a espontaneidade em sua natureza. 2 + 2 isso aí. O medo nada mais é que um desconhecimento. Tememos o que não entendemos. O Império não entende o Grupo Especial, ainda. No domingo, dia 2, pode ser que entenda. Hoje não! O Império que deu sacode em 2013 não apareceu, não vi, era outra escola. Mas aponto o dedo sorridente ao notar as carrancas - usadas na Comissão de Frente do ano passado – emoldurando o ensaio técnico de cabo a rabo. Exalto o casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira, Peixinho e Jaçana, pela fantasia oficial do Carnaval 2013. Respeito e carinho ao público que foi à Sapucaí. E claro, a ótima apresentação dos dois, como sempre. A destacar positivamente também, a Comissão de Frente, de Júnior Scapin, apresentando-se com a coreografia oficial de desfile. O trabalho coreográfico é bem denso, Comissão bastante expressiva. Mas faço um adendo aqui da falta de canto dos componentes do grupo. Em determinados momentos o samba não foi cantado. Não que haja a necessidade de cantar o tempo inteiro. Mas nos instantes em que a coreografia é menos rebuscada há espaço para o canto. É sempre bom cantar, nunca é demais. Hino é hino. Muitas alas coreografadas dão sempre um efeito bacana, mas coreografia não imuniza ao cantar. Isso é velho. Antigo. O camarada que está coreografado precisa cantar. A ala da capoeira gerou uma expressão imediata de negação em quem estava acompanhando. Confesso até um inconformismo. Muda. E as outras cantaram pouco. A cabeça da escola cantou o samba integralmente, e o que se viu foi a promessa de um bom canto, mas houve um declínio. Mesmo assim, não achei o canto dos piores, tirando as alas coreografadas. A evolução ficou devendo. Não em organização. O Império veio organizado, certinho, sem falhas em evolução aos meus olhos. Mas não se encantou, talvez pelo medo de se empolgar demais. Medo de errar tira o ímpeto de vencer. É o treinador retranqueiro que joga pelo 0x0. O Império veio pelo empate, veio para cumprir tabela. Faltou imergir no samba decantado por todos como dos melhores. Inclusive, o samba-enredo era o item que sempre separou o Império da Tijuca da equidade na comparação com Inocentes e Renascer, ascensionadas nos últimos dois anos. O samba dava ao Império uma chance a mais de não cair no cruel retrospecto do subiu-desceu. Não consigo mais distinguir a escola do morro da Formiga às outras duas. Assim como Renascer e Inocentes, o Império é o candidato mais forte ao descenso.
SÃO CLEMENTE – Incoerente ao nome, a preto e amarelo foi inclemente ao Império da Tijuca. Diferente da verde e branco, não teve medo. Já robusta, não tem receio de ser comparada com as grandes do carnaval. É claro, não é, ainda, uma escola dos sacodes. O samba da São Clemente, a meu ver mais fraco do Grupo Especial, funcionou muito melhor que o da escola anterior. Igor Sorrisos. No plural. A São Clemente sorriu. Os dentes de Igor foram vistos em outras bocas pretas e amarelas. Uma escola que passou feliz, evoluindo de maneira descompromissada, ao estilo dela. A direção não quer irreverência, mas a identidade é tão latente que ela se faz presente nos ensaios, não tem jeito. Para quem busca afirmação e consistência, está de bom tamanho. Caminho certo para manter-se por mais um ano e igualar o recorde histórico de cinco carnavais seguidos no especial, alcançado entre os anos 80 e 90. O Canto não foi comparável à Mangueira, nem Ilha, tampouco Mocidade. Mas foi satisfatório. A evolução, apesar de alguns desencontros de coesão nos espaçamentos e ordenação dentro das alas, foi alegre, contagiante, feliz, divertida, alto astral. Jeitão São Clemente. São Clemente assim a gente quer. São Clemente igual a Beija-Flor a gente dispensa. Cada uma preservando o seu jeito de fazer carnaval, sempre. Gostei da evolução de modo geral. Tem algumas coisas a serem notadas, como alguns enxertos desnecessários. Algumas escolas têm mostrado a necessidade de correr, a São Clemente mostrou planejamento ao evoluir de maneira linear, sem aceleradas repentinas. Comissão de Frente, coreografada por Regina Sauer e Carlos Bolacha, veio a cara da preto e amarelo. Brincalhona. A caracterização dos meninos da favela, cabelinho tingido de loiro, com a pele negra. As cores da escola, com um retrato fidedigno da realidade favela, realidade a ser - pelas explicações do enredo - escondida neste carnaval clementiano. Simpatia total também as meninas de Black power. De modo geral, um ensaio bom da escola. E num dia importantíssimo, falemos a verdade, né? Não há como esconder que existe aí, uma rivalidade implícita bem clara. Talvez não entre as escolas, entre as diretorias, mas para a gente que acompanha e para as torcidas das duas, existe sim. E nesse confronto direto, a São Clemente evidenciou as diferenças entre uma escola robustecida, encorpada, para uma que volta 18 anos depois. A análise carnavalesca colocava São Clemente e Império da Tijuca em patamares próximos até o ensaio deste sábado. Depois de hoje, vejo um Império com 20 dias para superação emergencial. E uma São Clemente encaminhada, e bem, para mais uma permanência tranquila.
RANKING:
1 - Mocidade
2 - Grande Rio
3 - Salgueiro
4 - União da Ilha
5 - Mangueira
6 - São Clemente
7 - Império da Tijuca