Homenagem à Angra dos Reis.

Enredo: "Angra com os reis"
 
“É treze dias, treze noite. Foi que os três reis viajaram. Quando chegaram em Belém, todos os três descansaram. Rei Melchior, Baltazar, Gaspar e companhia. Foi visitar o Deus nascido, filho da Virgem Maria. Toparam Deus menino e veio grande alegria. Levaram mirra, incenso e ouro pra Deus oferecia. Nossa Senhora agradecia nós vamos despedir, desse presépio sagrado, aquele que me ouviu, até breve, muito obrigado.” (citação em Jongos, Calangos e Folias)
 
Foliões da corte imperiana, hoje é o grande dia! Sigam o bandeireiro que carrega o estandarte da folia dos santos reis, ornado com rosas em tons claros e enfeites de espelho. Os palhaços, com suas máscaras cintilantes e seus apitos estridentes, afastam o mal e incorporam a fé. São mirabolantes piruetas que, numa profusão de multicores refletidas em suas vestes, nos fazem delirar. Os cantadores entoam em seus versados a história de terras distantes e anunciam que o salvador nasceu!
 
Nós, os Reis Magos do menino Jesus, que já ofertamos a mirra, o incenso e o ouro, pedimos ao reinado da Serrinha que tragam para este cortejo seus pandeiros, tamborins e agogôs. Nossa folia parte desse cantinho que foi recortado e desenhado entre o mar e as montanhas, feito obra do nosso Deus. As cores d’África, que bordaram essa história, agora iluminam com mais força a nossa bandeira em cortejo.
 
É tempo de festa, são os festejos da fé. Vamos saudar o Divino Espírito Santo, com tapetes de serragem colorida e lençóis brancos nas janelas. Vamos rezar com Nossa Senhora da Conceição e com São Benedito, aproveitando a festança com o congado. Em coro cantamos as memórias de Moçambique, de Congo, de Angola; canto nêgo, batuque forte, preto banto, nação Nagô. O festeiro comanda a tirada da bandeira e anuncia a próxima parada. É tempo de improviso, de jongo e de calango.
 
“No Batuque com os Reis”
 
“Nasci na Angoma, gente, e Angoma quem me criou. Eu sou filho de Moçambique, gente, eu sou negro sim senhor.” (Ponto de Jongo de tradição oral)
 
Em Santa Rita do Bracuí, terras de desembarque de “peças” em cativeiro ilegal, gente quilombola se formou. Gente que nas horas de lazer teve o dom de rimar, versar histórias, contos e cantos do seu bravo cotidiano. Gente guerreira que com suas mãos trabalharam na lida do ouro e trilharam histórias com a estrada real. Mãos que cortaram cana de açúcar no pé e que carregavam as águas do Aqueduto da Vila do Abraão, relíquia de Ilha Grande que tanto inspirou Dom Pedro II em suas visitas pela região. As mesmas mãos calejadas que construíram a sua resistência, agora tocam seus tambores e dão ritmo ao candongueiro e ao caxambu.
 
O ponto é a flecha! É um dizer, com dois entender. Enfeitadas com suas saias floridas as meninas giram forte na roda, a nação imperiana veio nos visitar! A roda agora está completa e o jongo pode começar! É a luta pela consciência negra, é o brado da identidade africana e quilombola que une a comunidade de Bracuí com os jongueiros da Serrinha. E assim, pelos caminhos do jongo, vamos conhecendo e reencontrando nossos irmãos. A benção, Angoma puíta, cante alto meu véio prosador... A benção, mãe preta do terreiro, tocaremos alto o som do tambor.
 
“Tropicalmente com os Reis”
 
“Assim como os três reis magos que seguiram a estrela guia. A bandeira segue em frente atrás de melhores dias. No estandarte vai escrito que ele voltará de novo. E o Rei será bendito, ele nascerá do povo, ai, ai”. (Ivan Lins)
 
Nascido do povo, o menino imperador do Divino Espírito Santo é o sinal da aliança entre Deus e os habitantes da terra. E nessa hora, o cortejo irá reverenciar o paraíso natural, e toda a corte imperiana benzida pela oração poderá admirar o sol se pôr às margens da Lagoa Azul. É hora de fazermos um mergulho pelas profundezas dos mares desse lugar, com praias deslumbrantes e ilhas de riqueza natural.
 
Um novo mundo a descobrir: da região portuária ao pioneirismo da cultura da pesca, vemos os peixes de tons exuberantes, algas-marinhas que pulam no nosso olhar. As águas-vivas parecem bailar com a folia do cortejo subaquático. Plantas gigantescas, flores exóticas e pássaros coloridos nos recebem como cartão-postal de inspiração para que a corte imperiana se sinta tropicalmente fascinada!
 
No encontro com as belezas da região, vemos que a própria natureza é transformada em eletricidade, através das usinas nucleares da região. É uma realidade, está lá. E tendo consciência ambiental, o progresso é aceito com preservação!
 
Emergimos das profundezas dos mares na praia de Mambucaba, do Sul, do Leste e com a leveza de uma gaivota que plaina sobre esse mágico lugar, descobrimos o verde que envolve o azul e dá forma à angra, linda Angra. Nossa Angra que recebe uma corte suburbana em folia tropical, uma Angra de Reis!
 
“A Coroação dos Reis da Serrinha pelos Reis Magos”
 
“Como se saúda a Rainha do Mar? Alodê, Odofiaba, Minha-mãe, Mãed'água, Odoyá! Qual é seu dia? Nossa Senhora? É dia dois de fevereiro. O que ela canta? Por que ela chora? Só canta cantiga bonita. Chora quando Quando na beira da praia. Eu vou me abençoar. (Pedro Amorim e Paulo César Pinheiro)
 
E por fim, nós, os reis de uma cidade, os reis da fé, faremos a coroação do reinado da Serrinha, do Reizinho de Madureira, em plenas águas da rainha do mar, sobre o cortejo que junta alegria e fé, história e causos, e reverência toda corte do samba. Junto com a procissão marítima de final de ano, saudaremos os convidados dessa festa: A nação imperiana!
 
O jongo que nos une e que nos mistura em uma só identidade fará a melodia que bordará esse encontro. As múltiplas cores do cortejo vão se unir ao verde e branco do nosso manto. A sinfônica orquestra de Madureira rufará seus tambores para receber a bênção e a coroa dos reis que um dia coroaram o menino Jesus.
 
E dessa forma os baluartes do samba, os fundadores do nosso pavilhão, todos que criaram uma nação de sambistas verdadeiros, são honrosamente coroados. Hoje é o dia da vitória, o dia da coroação dos mestres sambistas pioneiros. Hoje é o dia daqueles que fizeram da nossa escola de samba o patrimônio histórico cultural. E que assim seja, sob as bênçãos de Odoyá!
 
Entre o sagrado e o profano, foliões de reis e foliões do samba nesse dia carregarão uma só coroa: a coroa do glorioso Império Serrano.
 
Com carinho, Melchior, Baltazar e Gaspar.
 
Pesquisa e texto do enredo: Eduardo Gonçalves e Eduardo Nunes
Livremente inspirado na obra filmográfica “Jongos, Calangos e Folias: música negra, memória e poesia.” Direção Geral: Hebe Mattos e Martha Abreu.